sexta-feira, 3 de julho de 2020

DIÁLOGO(S) COM A SOCIEDADE: DE MÃOS VAZIAS

O meu nome é Sábado Indi. Nasci e cresci em Safim. Vim para Bissau depois do meu casamento e desde então resido no bairro de Antula.

Vendo camarões há muito tempo. Na verdade, era a única coisa que vendia até 1997, quando deixámos de utilizar a moeda Peso e as coisas foram aos poucos tornando-se mais difíceis.

Madrugávamos: por volta das quatro da manhã eu e as minhas colegas já estávamos de pé esperando o carro para irmos até Quinhamel comprar camarão-tigre. Depois era voltar para Bissau e andar o dia todo na Praça até vender tudo e ir para casa. No caminho comprava arroz e mafé. Uma vez em casa, cozinhava.

Esta sempre foi a minha rotina. Mas, como disse, quando passámos a utilizar o Franco CFA as coisas foram piorando... É verdade que já não tínhamos que ir até Quinhamel pois já havia local de compra aqui em Bissau, no Porto de Bandim. Mas por outro lado, os camarões-tigre foram-se tornando cada vez mais raros e caros, por isso, passei a comprar outros mariscos e peixes. O tempo que levava para conseguir vendê-los também foi aumentando e negociar tornou-se aos poucos mais complicado.



Já passei por muitos momentos difíceis na minha vida - a guerra de 7 de junho foi um deles - mas confesso que em termos de vendas nenhuma dessas dificuldades pode ser comparada com o que estou a viver nestes últimos meses devido ao Covid-19.

Primeiro disseram-nos para ficarmos confinados em casa, mas sem qualquer tipo de apoio, nem sequer um saco de arroz. Como é a lei, obedecemos. Mas, foram dias extremamente difíceis. Como ficar o dia todo sem trabalhar? Eu não tenho outra forma de sustento, é disso que eu vivo e foi assim que criei os meus filhos.

Depois disseram-nos que poderíamos circular até ao meio dia. Afinal, o que poderia eu conseguir vender se só tinha até às 11h para fazê-lo e depois restavam-me apenas 1h para voltar a pé para casa? Os transportes públicos estavam proibidos de circular e era a pé que ia até ao porto, de lá para a Praça e, por fim, até minha casa. Não sobrava praticamente tempo para as vendas! Sem contar que a maioria das pessoas estava em casa e queixava-se da falta de dinheiro. Foram dias de muito esforço para nada!

Atualmente, com o novo estado de emergência as coisas mudaram um pouco - o que não significa que estão menos difíceis. Todas as minhas colegas se queixam das dificuldades para conseguir vender. Umas acabaram por deixar os mariscos e decidiram tentar a sorte com outros tipos de produtos: estão a cavar pedras e juntar areia para vender.

Eu vou continuar a fazer o que sei. Sinceramente, espero que tudo isso passe logo. Tenho pedido a Deus que esta doença vá embora. Não posso continuar assim, de “mon limpu”.

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