A Fátima Proença, de nacionalidade portuguesa, nasceu em Coimbra, em 1953. Aos 18 anos, quando concluiu o Liceu, fez uma viagem a Paris, onde encontrou muita informação e propaganda de grupos de oposição ao regime então vigente em Portugal e também dos movimentos de libertação nas antigas colónias, que denunciavam as atrocidades do regime.
Enquanto estudava Economia no ISEG, esteve ligada aos chamados “católicos progressistas”, que colaboravam na produção e divulgação clandestina do “Boletim Anti-Colonial”. Conviveu com personalidades marcantes da luta antifascista e anticolonial, entre os quais Nuno Teotónio Pereira, que, um dia, lhe pediu para dactilografar no Stencil um documento confidencial para sua distribuição clandestina em Portugal. Era o “Relatório dos Missionários Católicos sobre o Massacre de Wiriyamu”, perpetuado pelas forças coloniais portuguesas em Tete, no Norte de Moçambique, em dezembro de 1972.
Logo após o 25 de Abril, o grupo do “Boletim Anti-colonial” criou o Centro de Informação e Documentação Anti-Colonial - CIDAC, que foi instalado num apartamento em Lisboa cedido pela Editora Afrontamento, com uma equipa que era dirigida pelo Luís Moita e integrava a Luísa Teotónio e a Carolina Quina. O CIDAC mudaria de nome mais tarde, para Centro de Informação e Documentação Amílcar Cabral. No início dos anos 80 foi criado no CIDAC o grupo da Guiné-Bissau, com o qual a Fátima colaborou, apoiando na organização de iniciativas de formação de jovens guineenses, quadros no Estado em construção, formação de voluntários destacados para missão no país e nomeadamente na produção do Guia do Cooperante da Guiné-Bissau.
Em 1983, a pedido do então Ministro da Informação da Guiné-Bissau, Filinto Barros o CIDAC propõe à Fátima uma missão de 2 meses a Bissau, para apoiar na organização do Centro de Documentação Amílcar Cabral, no Ministério do Plano e assegurar a formação na área documental dos responsáveis de documentação dos vários ministérios.
Em 1985 regressa a Bissau, desta vez com o marido, Carlos Sangreman. Ele, a convite do falecido Bartolomeu Simões Pereira, então SE do Plano, para lhe prestar assessoria na organização das contas nacionais e do sistema estatístico. Ela, a pedido de Carlos Lopes, que dirigia a equipa do recém-criado INEP. Fátima iria trabalhar no Centro de Estudos Socioeconómicos do INEP, em estreita colaboração com a sua diretora, a falecida Diana Lima Handem. Trabalhou no primeiro levantamento da documentação socioeconómica para constituir a base de dados da documentação do INEP. Colaborou no lançamento do BISE (Boletim de Informação Socioeconómica) e da SORONDA. Foi neste período que a Fátima conheceu o Eng. Carlos Silva, vulgo Pepito, de quem viria a ser grande amiga e aliada de muitas lutas.
Quando regressou a Portugal, foi trabalhar para o CIDAC, a tempo integral, integrando o departamento de Cooperação e direcção do CIDAC em 1987. E é no CIDAC que colabora e apoia vários projetos e iniciativas de vulto, que marcaram uma época na Guiné-Bissau, como o Programa Integrado de Caboxanque, PIC, implementado no Sul pelo DEPA (Departamento de Pesquisa Agrícola), dirigido pelo Pepito e a 1ª Conferência das ONGs, organizada pelo Ministério do Plano e Cooperação Internacional e no âmbito do qual foi criada a Solidami, um gabinete de apoio à coordenação da Ajuda não-Governamental à Guiné-Bissau.
Quando o Pepito lhe anunciou que ia deixar o DEPA e criar uma ONG para continuar a trabalhar com as comunidades rurais na sua organização e melhoria de suas condições de vida, a Fátima Proença abraçou com entusiasmo o projeto de criação da Ação para o Desenvolvimento. Colaborou com a AD em variadíssimos, projetos, estudos e realizações, com destaque para a criação do GAPA - Gabinete de Apoio às Associação Camponesas, a criação das primeiras rádios comunitárias, como a Voz de Quelelé e a Kassumai.
Quando se deu a Guerra de 7 de junho de 1998, Fátima Proença abriu as portas da ACEP uma ONGD portuguesa que ela dirigia então, para acolher os seus parceiros e amigos guineenses que se refugiaram em Lisboa. Ajudou-lhes a organizarem-se para socorrer as populações mais vulneráveis, vítimas do conflito e para intervirem no campo internacional em favor da paz na Guiné-Bissau. E assim foi criada a Rede de Solidariedade com o Povo da Guiné-Bissau, que ela coordenou juntamente com os líderes de 3 ONGs parceiras, a AD, a Aifa-Palop e a Tiniguena. A notícia da ocupação pelas forças militares senegalesas e consequente destruição parcial do INEP, atingido por bombas, foi particularmente dolorosa. Contribuir para a reabilitação do INEP passou a ser uma das prioridades da Rede. No final do conflito, a Fátima fez entrega oficial à direção do INEP de uma caixa contendo as disquetes onde estava gravada toda a documentação recolhida e catalogada sobre a guerra e o trabalho realizado pela Rede de Solidariedade.
Findas as hostilidades, ela ajudaria a mobilizar parceiros e meios avultados para apoio à AD, AIFA e Tiniguena na reabilitação e relançamento socioeconómico de 3 bairros de Bissau, onde tinham suas sedes: Quelélé, Militar e Belém (2000/2003). É dessa época a criação da Escola de Artes e Ofícios de Quelélé, da qual a Fátima foi embaixadora incansável.
Dessa época também foi o apoio que a ACEP, sob a sua direção, prestou à criação da plataforma das ONGs que intervêm na Guiné-Bissau (PLACON-GB) que desempenhou um papel importante no trabalho político das ONGs em prol do relançamento da Guiné-Bissau (2000/2008). O reforço de redes colaborativas de ONGs continuaria a merecer a especial atenção da Fátima, que apoiou vários estudos e encontros realizados sobre a temática, entre os quais a organização da 3ª Conferência das ONGs feita em Bissau, em 2017.
Muitos outros projetos e organizações beneficiariam depois da colaboração com a Fátima e a ACEP, entre as quais a Associação de Fruticultores de Cubucaré (AFC), através do DEPA e da AD, a Associação Zona Verde, via Tiniguena e outras organizações de produtores e moradores enquadrados pelos parceiros AD, Aifa, Tiniguena e Rede Ajuda, que ela ajudou a lançar. Liga Guineense dos Direitos Humanos, AMIC, RENAJ, RENARC, RENLUV, também mereceram uma atenção especial da Fátima. Ela apostou fortemente na criação da Casa dos Direitos, fundada em 2012 e que até hoje junta organizações da sociedade civil guineense empenhadas na promoção dos direitos humanos, incluindo os cívicos, económicos e ambientais.
Fátima Proença tem sido embaixadora comprometida com a Guiné-Bissau e o seu povo durante toda a sua vida. Colaborou com muitas instituições e personalidades de destaque, quer ao nível do governo, quer da sociedade civil guineense. Fátima nunca deixou de responder sim! à Guiné-Bissau, nos momentos mais conturbados… mas também nos momentos de celebração, como este que vivemos agora... Fátima ajudou a conceber, a organizar, a dar pés para andar e asas para voar a iniciativas inovadoras, a projetos impactantes, sempre em parceria com outros guineenses e amigos desta terra, que sonharam, acreditaram e como ela, apostaram na Guiné-Bissau!
Por tudo isso a família da Tiniguena te reconhece e homenageia hoje, pelo seu 30º Aniversário, com o Prémio Promoção da Cidadania na Guiné-Bissau.